“VITÓRIA ESTREITA” DO MPLA, DIZ A EURASIA

A consultora Eurasia considera que o MPLA vai vencer as eleições de Agosto, mas pela margem mais pequena de sempre, levando João Lourenço a ter de apostar – como o seu partido promete há 46 anos – na melhoria das condições sociais dos angolanos.

“As eleições de 2022 vão provavelmente ser as mais disputadas desde que o país se tornou independente, devido aos danos reputacionais ao MPLA, bem como à periclitante campanha anticorrupção e ao progresso lento das reformas lançadas por João Lourenço”, escrevem os analistas.

Numa análise sobre as eleições de Agosto em Angola, enviada aos clientes, a directora do departamento africano da Eurásia, Shridaran Pillay, e a investigadora Jeanne Ramier escrevem que, “se for eleito”, concluem, “João Lourenço terá provavelmente de aumentar o foco na melhoria das condições sociais, especialmente se o resultado for decepcionante na eleição, ao mesmo tempo que terá de manter os compromissos assumidos com o Fundo Monetário Internacional, como remover os subsídios”.

Na análise às eleições, as investigadoras escrevem que “o apelo do partido no poder, largamente alicerçado no papel histórico da luta de libertação e da guerra civil, está a desvanecer-se, já que os eleitores mais jovens, que não viveram a guerra e são indiferentes a esta narrativa, estão mais preocupados com a educação, o desemprego, a falta de oportunidades económicas e os cuidados de saúde”.

As eleições, agendadas para 24 de Agosto, são as primeiras em que a geração nascida depois da guerra vai poder votar, e será também a primeira em que a diáspora poderá (mais ou menos) exercer o direito de voto.

“Não há uma indicação clara sobre quem a maioria da diáspora apoia, o que torna estes eleitores importantes de seguir”, escrevem as analistas.

A Eurasia antevê uma vitória do MPLA, mas por uma margem mais estreita, “mantendo a tendência que se acelerou nas últimas eleições”, e considera que “não é certo que o MPLA consiga manter a maioria absoluta e o direito de, sozinho, mudar a Constituição”, o que se torna menos importante dado que não é possível alterar a lei fundamental nos próximos nove anos.

As eleições municipais do próximo ano (se tiverem lugar), consideram, “serão o principal motivo de combate político e um grande teste para o MPLA”, já que a oposição pode ganhar algumas autarquias importantes, “obrigando o MPLA a, de alguma maneira, ter de partilhar o poder” com a UNITA.

Para a Eurasia, um segundo mandato de João Lourenço será marcado pela continuidade das políticas: “O Presidente está empenhado na reforma da economia e vai continuar a sua agenda sobre a estabilidade macroeconómica, consolidação orçamental e privatizações”, apontam, notando que uma das prioridades será “diversificação da economia e o desenvolvimento da agricultura e da mineração, ao mesmo tempo que combate o declínio da produção de petróleo”.

O próximo governo, continua a Eurasia, terá múltiplos desafios, entre os quais se contam “o alto desemprego, inflação galopante, elevado custo de vida, aumento das greves e protestos, pedidos de democratização e a crise humanitária no sul do país”.

João Lourenço e o MPLA querem guerra

Num recente simulacro de conferência de imprensa dada órgãos seleccionados e com o envio antecipado das perguntas, João Lourenço afirmou que a UNITA, maior partido da oposição que o MPLA ainda permite, pretendia concorrer em coligação com outras forças políticas, nas eleições gerais deste ano, porque não está preparada para vencer sozinha o MPLA.

João Lourenço tem razão. E isso não é uma necessidade para o partido de João Lourenço já que, reconheça-se, para o MPLA basta ser dono de toda a máquina eleitoral, comandada pela sua sucursal, Comissão Nacional Eleitoral.

O chefe de Estado disse aos “jornalistas” que a oposição, desde as primeiras eleições gerais realizadas em Angola, em 1992, tem feito uma má leitura do “teatro das operações” político do país.

“Teatro das operações” foi, de facto, uma excelente alegoria, ou não fosse João Lourenço um general. Aliás, nada melhor do que uma linguagem belicista para lembrar que – como dizia o inimigo “número um” do MPLA, Jonas Savimbi – só faz a paz quem estiver preparado para fazer a guerra. Semeia ventos e quer colher bonança.

“Desde as primeiras eleições de 1992, que a oposição de forma errada” tem feito uma “má avaliação do teatro das operações”: Já “nas eleições de 92 diziam que o MPLA não tinha hipótese, pelo simples facto de, até àquela altura, ter sido partido único. Com a abertura para o multipartidarismo, antes das eleições acontecerem, já diziam ‘calças novas em Setembro’”, mas isso “não aconteceu, nem nas eleições seguintes”, disse João Lourenço.

Para João Lourenço, “mais uma vez também para estas eleições continua a haver essa má avaliação do teatro das operações”. É verdade. Graças aos seus generais, o MPLA avisa que ou ganha… ou ganha.

“No fundo, no fundo, o simples facto de o nosso principal adversário recorrer a uma espécie de coligação” a que “estão a chamar Frente Patriótica Unida, para enfrentar o MPLA, isso só significa dizer que, se calhar, estão pior do que estavam há uns anos atrás, nas eleições anteriores”, frisou o Presidente do MPLA, já que enquanto Presidente da República “manteve” uma equidistância institucional…

Jovens angolanos são do MPLA. Fora disso são arruaceiros ou terroristas

Noutra frente do ”teatro de operações”, registe-se que em Angola existem dois tipos de juventude. Uma boa – a do MPLA, e a outra. A JMPLA enquanto mero instrumento do partido está, e tem razões para isso, preocupada com o comportamento que os jovens angolanos apresentam nos últimos tempos. Isto porque, ao contrário do que era habitual, a juventude começa a pensar pela própria cabeça, recusando a regra de ouro do regime que sempre visou formatá-la e domesticá-la.

Há uns anos, Tomás Bica, primeiro secretário da JMPLA na capital, disse que a organização juvenil do MPLA, partido que só está no poder desde 1975, pretendia levar a cabo uma série de debates, presume-se que – como é hábito – enquadrados na necessidade ancestral e atávica de reeducar a população.

“A estabilidade familiar é a estabilidade que se pretende, porque as famílias constituem a primeira e a mais antiga instituição de toda sociedade, razão pela qual famílias estáveis significam Estados estáveis, de tal ordem que pedimos à sociedade que o país seja estável, mas é preciso que, primeiramente, as famílias estejam estáveis”, disse Tomás Bica numa tirada filosófica que, só por si, é paradigma do estado actual de alguns dos jovens… do MPLA.

Por sua vez a directora do Gabinete de Cidadania e Sociedade Civil do MPLA, Fátima Viegas, entendia que “um dos remédios está na educação e outro está no papel que a família, enquanto esfera socializadora, deve fazer, porque estes jovens saíram de uma família. Se desta família eles não receberem, eles também não podem dar”.

Certo é que, reiteradamente, a JMPLA necessita de mostrar serviço no âmbito da formação político-patriótica, de modo a inculcar na sociedade que sem o MPLA será o desastre total.

Os meninos do regime ainda não atingiram a fase de pensarem livremente. Quando lá chegarem, se chegarem, só não vão zarpar da JMPLA porque ainda não se sabe se, como no passado recente, as balas e os jacarés estão prontos para satisfazer os ávidos apetites sanguinários dos que matam primeiro e perguntam depois. Quer os jovens autómatos do regime queiram ou não, nem todos os jovens concordam que – por exemplo -o dia 14 de Abril, que consagra o dia da juventude do MPLA, em memória de Hoji Ya Henda, o patrono da JMPLA, seja igualmente considerado o Dia da Juventude angolana.

Será, com certeza, difícil ou até mesmo inexequível encontrar uma data que gere unanimidade. Em democracia o melhor que se consegue, quando se consegue, é um consenso. Encontrar, ou até mesmo criar de raiz, um dia que esteja equidistante das datas assinaladas pelos diferentes partidos seria, cremos, a melhor solução para homenagear todos os jovens angolanos que, de facto, merecem ter um dia que assinale o seu contributo em prol do país.

Desde a independência que Angola tem comemorado – com um enorme abuso de poder e unicidade só aceitável nos países de partido único – o 14 de Abril como o Dia da Juventude Angolana. Com a morta à nascença abertura protagonizada por João Lourenço, chegou a pensar-se como exequível implantar um sistema político que albergue a diversidade de opiniões como uma mais-valia de incalculável valor patriótico.

Não é sério, muito menos legítimo e democrático, que se continue a subjugar toda a juventude, bem como todo o resto da população, às teses do partido reinante. De facto, a comemoração com toda a pompa e mordomias inerentes do 14 de Abril era (e poderá continuar a ser) aceitável como marco interno do MPLA e não como algo que possa representar toda a juventude de um país que, também nesta matéria, pretende respeitar e enquadrar-se nas regras de um Estado de Direito, isto se um dia deixar de ter força de lei (e das armas) a tese de que Angola é do MPLA e o MPLA é Angola.

Embora nem todos tenham consciência disso, o país é hoje outro, amanhã será ainda um outro, pelo que não pode haver receitas unilaterais feitas à medida, e por medida, de um regime que só conhece a razão da força.

Importa que o regime compreenda, embora a isso seja alérgico, que em democracia quem mais ordena é o Povo. E esse Povo não pode estar sujeito a regras que mais não são do que perpetuar o culto sabujo e bajulador a valores e pessoas que em vez de o servirem se servem dele.

De facto, o governo não tem tido vontade, embora tenha os meios, para resolver os problemas do Povo, sejam eles da fome, da miséria, da água, da luz, do lixo, da saúde, de emprego ou da educação da população em geral. No que tange à juventude, esta não tem casa, não tem educação (embora seja educada), não tem emprego e não tem futuro.

Por tudo isto, e não só, a juventude quer mais do que nunca ser ouvida e ter, para além de uma voz gritante e activa, possibilidade de dizer de sua justiça, de participar na vida do seu país. O regime ao obrigar os jovens a aceitar como única a lei do mais forte está a atirar a juventude para as margens da sociedade. E, muitas vezes, demasiadas vezes, quando se está na margem escorrega-se para a marginalidade como antecâmara da violência, da criminalidade ou até da guerra.

Ao contrário do que eventualmente podem pensar os dirigentes do regime, a juventude está atenta a tudo isto e é sobretudo isto que a preocupa. Nós temos jovens que, como nos ensinou Nelson Mandela, são heróis não porque não sintam medo, mas porque o vencem.

Folha 8 com Lusa

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